Guia Maçónico (1913)

Guia Maçónico (1913)

Este Guia Maçónico teve a sua 1ª edição em 1905 e uma 2ª edição em 1913, e reflecte o pensamento e as preocupações da época. Reproduz-se a sua introdução e disponibiliza-se no final o documento na totalidade.

A Maçonaria

A Maçonaria trabalha para o aperfeiçoamento dos costumes, para tornar o homem melhor e mais altruísta, respeitando sempre as leis do seu país.

Não é uma escola de ciência ou de eloquência; ama o progresso e proclama a tolerância.

Analisa e compara todos os sistemas, que acolhe, sem excepções. Paira acima de todas as ideias de seita ou de partido, político ou religioso, abrigando quem trabalhe pela Verdade, e pela Justiça, conscienciosa e desinteressadamente.

Transforma-se segundo as exigências dos tempos, e está pronta a abater “suas colunas” quando lhe demonstrem que é prejudicial ou inútil.

Examina e estuda, norteada pela razão; a sua força e a sua grandeza veem-lhe do livre exame. Não impõe as suas doutrinas, – raciocina -, converte por factos, e convence pela persuasão.

É compatível com a crença em Deus e na alma; mas permite também a sua negação absoluta. Não admite a sua indiscutibilidade; mas evita-a, como as questões políticas, para não originar desavenças entre Irmãos, tratamento que seus membros usam. Não afirma nem nega: procura a verdade.

Os seus estudos aproveitam-lhe e aos adversários; o seu ideal é o bem da humanidade. Encerra o culto universal do futuro.

A sua religião é a do Bem e do Belo.

Os mais puros preceitos de moral estão no seu código:

  • Ama os outros como a ti mesmo.
  • Dize a verdade, pratica a justiça, pensa com rectidão.
  • Não faças a outrem o que não queres que te façam [1].
  • O verdadeiro culto está nos bons costumes e na pratica da virtude.
  • Fazei o bem só por amor do Bem.
  • Não digas ao teu irmão necessitado:— vai e volta amanhã; socorre-o logo, só se não puderes.
  • Ama os bons, lastima os fracos, evita os maus; mas não odeies ninguém.
  • Escuta sempre a voz da tua consciência ; é o teu juiz.
  • Protege os pobres; cada suspiro que o teu empedernimento lhes arrancar será uma maldição que cae sobre a tua cabeça.
  • Foge a contendas, evita os insultos; mas obedece sempre à razão.
  • Lê e aproveita; vê e imita; reflecte e trabalha; faz tudo para bem de teus irmãos, que trabalhas para ti.
  • Está sempre alegre de tudo e com tudo se a honra a isso não for contrária.
  • Respeita as mulheres, nunca abuses da sua fraqueza; prefere morrer a desonrá-las.
  • Se vieres a ser pai, alegra-te; mas compreende a importância da tua missão. Sê para o teu filho um protector liei. Faze com que te obedeça até aos doze anos; Te ame até aos vinte e te respeite até à Até aos doze sê seu senhor, justo e bondoso; até aos vinte, seu pai e até à morte, seu amigo. Dá-lhe bons princípios antes que bons modos; que te deva uma rectidão esclarecida e não uma elegância frívola; fá-lo antes homem honesto que homem subtil.
  • Deixa falar os
  • Fala sobriamente com os grandes, prudentemente com os teus iguais, sinceramente com os amigos, docemente com os pequenos, ternamente com os pobres.
  • Não lisonjeis o teu irmão, é uma traição; se alguém te lisonjear olha não te corrompa.
  • Respeita os estranhos à tua família e à tua pátria; seja a sua pessoa sagrada para ti.
  • Não te envergonhes da tua posição; seria orgulho; não é a ocupação que honra ou degrada o homem, mas a maneira porque a
  • Regozija-te com a justiça; detesta a iniquidade; sofre sem te
  • Em todas as tuas acções faz sempre com que a razão figue do teu lado.
  • Não julgues ao de leve as acções dos Louva pouco e censura menos.
  • Lembra-te de que. para julgar os homens, e preciso sondar os corações e perscrutar os intentos.

Pela ciência, organização social e edução, está assegurado o progresso da moralidade no orbe.

A reforma dos costumes, que imprime gradualmente modificações às leis sociais, é a única de que trata a Maçonaria.

Procurando a serenidade podemos aumentar a felicidade e a esfera de acção individual e colectiva.

Afirmando um ideal moral de solidariedade e de justiça, nós experimentamos transfigurar o homem e a sociedade.

A investigação da verdade traz, o esquecimento das misérias pessoais e humanas.

A arte de ser feliz, é a arte de bem compreender a vida. É preciso adaptar as exigências às coisas e às circunstâncias, e todas elas às necessidades.

A felicidade é incompleta se for egoísta.

A Pátria é muito amada pela Maçonaria.

Esta ideia não se adapta nem ao solo natal, nem à raça, nem à língua, nem à religião. É um pouco de cada uma destas coisas ; mas é sobretudo a tradição – a comunidade da educação e das recordações – e mais ainda, a vontade de estarmos juntos, no mesmo ideal e nas mesmas aspirações futuras.

Nas consciências modernas a justiça e a caridade estão a transformar-se, convergindo. Esta dilata-se e intelectualiza-se; a esmola individual e brutal é substituída por formas impessoais de assistência, fundadas no direito; assistência publica e assistência mutua. A primeira torna-se menos abstracta e mais humanitária; há leis de protecção, perdão e reabilitação.

Divergentes, no seu inicio, os sentimentos de justiça e caridade aproximam se e fundem-se em um único – a solidariedade.

A razão deu à moral e à educação moral uma base mais larga e mais sólida que qualquer dogma.

Todas as religiões ensinam a moral, e prestaram inegáveis serviços. Os deveres morais, familiares e sociais, já anteriores, eram apresentados sob a forma religiosa, como mandamentos ou ordens da divindade; e a propaganda fazia-se afirmando que o seu não cumprimento seria rigorosamente castigado.

A moral provinha do dogma pregado pelo sacerdote eleito ao serviço da divindade; e daí a autoridade, a força, a precisão e o grande poder de penetração na humanidade.

Mas o Livre Exame mostrou que o mais precioso de todos os tesouros das religiões – a moral – não pertencia nem vinha das igrejas ou das divindades, era património do homem, própria da sua natureza e das suas relações com os outros.

A razão libertou-se do dogma a que arrancou a moral, e com toda a imponência proclamou os direitos do homem, que mostram que um povo livre só precisa da consciência e da razão para educar seus filhos, numa completa instrução moral e cívica.

A moral não pode formar um corpo de doutrina como a matemática ou a física; mas não há-de deduzir-se da metafísica. Ela é relativa e evolutiva. É uma técnica particular, a técnica das acções humanas, que regula entre si e nas suas relações, como a ideia que cada um faz dessas relações – a obrigação moral.

Ora as sociedades variam dia a dia, insensivelmente, como os indivíduos que as formam; dai a mutabilidade da moral, que traduz uma soma de conquistas progressivas, alcançadas incessantemente, excedendo sempre as do momento anterior.

A moral provirá de factos verdadeiros, das suas leis e das regras práticas deduzidas da experiencia social e da experiencia intima da natureza humana; não há-de basear-se no dogma ou em outro corpo de doutrina.

E esta moral empírica tem a suprema poesia e o sentimento profundo da vida humana, tal qual é, do verdadeiro lugar do homem no universo, onde está, e onde tem de resolver todos os problemas sérios e mais fecundos que os da metafisica ou afirmações religiosas.

É todavia verdade que não pode avaliar-se nem escrever-se como um balanço comercial; seria pobre e acanhada. Tem de nortear-se por mais elevado ideal – do bem estar e da solidariedade humana.

Presentemente, em face das nossas leis, não há senão uma classe de cidadãos. Em relação à propriedade há duas: o proprietário e o trabalhador. Todos os homens são livres e iguais em direitos; e todavia alguns são livres para morrer de fome e iguais para morrer de frio. O patrão é igual ao seu empregado quando vota, nos poucos momentos em que se acerca da urna; mas é dependente dele, porque lhe dá para o pão no resto do tempo.

Estas desigualdades vão desaparecendo. Mas não se reconheceu ainda o divórcio e a liberdade religiosa; ainda não se tornou obrigatório o registo civil, a instrução primária, o seguro contra os acidentes de trabalho, contra a doença e invalidez; ainda não se afirmou o direito da defesa colectiva contra a exploração colectiva; não se protegeu o trabalho como se fez ao capital e à propriedade; não se cuida da protecção ás crianças e aos velhos, da fundação de creches, e de asilos para velhos e inválidos; não se pensa no operário durante a falta de trabalho, etc., etc.

A L∴ I∴ F∴ têm de ser ensinadas com restrições para manter a distinção existente entre proprietários e proletários; e a nossa moral ajuntará um capitulo novo – o da futura justiça social e o da moral futura.

Entre a moral das religiões e a moral maçónica há esta grande diferença: a primeira aceita, justifica e consagra a desigualdade, a injustiça social, prometendo a devida recompensa em outro mundo além deste; a segunda faz despontar na criança o desejo de melhorar este estado de coisas, em que nasceu e se há-de desenvolver; não lhe ensina a resignar-se e muilo menos a revoltar-se: diz-lhe que pode e deve reformar a sociedade Iodas as vezes e em todas as questões precisas,

Esta moral não é uma moral de tranquilidade: mas antes de trabalho lento e persistente para a igualdade social.

É o produto da consciência humana. Podemos legá-la sem vergonha a quem nos sucede e a nossos filhos. porque não há outra melhor para lhes deixar. É imperfeita, decerto; mas os que lhe fazem tal acusação esquecem-se de que se contentam, a pretexto de perfeição, com muito menos.

Quando do alto dos nossos altares se solta a ordem de – Trabalho – podemos sempre dizer à humanidade: Eis o que recebemos de nossos antepassados, eis o pouco que o nosso trabalho tem conseguido a mais; continuamos e perseveramos… porque a obra está apenas em principio. Nem vós nem nós lhe poderemos ver o fim.

Para poder seguir esta orientação é que a Maçonaria só abre as portas dos seus templos aos homens liberais e honrados. com meios suficientes de subsistência, e aptos para compreenderem os fins da Ordem, depois de com rigorosos inquéritos ter sabido das suas qualidades morais e pessoais. É preciso todo o escrúpulo; o numero, por vezes, vale pouco.

A Maçonaria, nos países em que domina o catolicismo, tem tendências diferentes das que apresenta nos outros países. O papa excomungou os maçons, e todo o seu exército os persegue. Está justificada a defesa, e a necessidade de guerra ao inimigo único.

Aí da Maçonaria se não tivesse inimigos! O que seria dela? Com quem havia de lutar?…

Ela só procura coloca-los a par.

Igual tratamento, os mesmos direitos, e ei-la na luta, que não teme, e de que há de sair vitoriosa. Avante pela razão!

Há homens muito inteligentes e generosos cuja razão e sentimento não assimilam a concepção maçónica.

Uns aderiram a doutrinas religiosas ou filosóficas de tal forma que não admitem que algum pensamento lhes possa ser superior. Outros, embebidos na política, na ciência, na arte, etc., com tanto entusiasmo o fazem que não podem ocupar-se de outro assunto. Estes não devem entrar na Maçonaria, porque evitariam a afirmação dos laços sinceros de amizade.

É muito antiga a Maçonaria. E no século XX não é nem pode ser o que foi na Idade Média. Mas os seus símbolos impressionam-nos os sentidos. Nada têm de velho. É uma questão de interpretação. Se forem restaurados, de modo que o ar vivificador e positivo do tempo no-los mostre sem incrustações e sem falhas, poderemos ver, na sua majestade brilhante, o Templo onde por muitos séculos se há-de sacrificar ao Bem e ao Belo, à Justiça e à Verdade.

Dr. A De S – Lavoisier 33º – R∴ L∴ Cons∴ Arcop∴ e Cap∴ Pureza nº 2
Oriente de Lisboa, em 18 de Maio de 1905  (e. v.)

Notas

[1] Este mandamento e acanhado e egoísta. Já em 1865 o Pod∴ Ir∴ Quintino Bucayuva dizia no Rio de Janeiro: “Esta máxima do evangelho envelheceu com o progresso. O homem não só é responsável neste inundo pelo mal que faz, mas pelo bem que deixa de fazer”.


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